sábado, 11 de fevereiro de 2012
Lola Majeure
Dors, ma rage, ma douleur
Dors, de moi je n'ai plus peur
J'ai goûté le bonheur
En Lola majeure
Dors, et va-t'en voir ailleursDors, de moi je n'ai plus peur
J'ai goûté le bonheur
En Lola majeure
A d'autres raconter mes malheurs
Tu n'es plus à la hauteur
De Lola majeure
Dès lors, je peux bien te laisser
Dehors, puisqu'au fond j'ai trouvé
De l'or tout à l'intérieur
En Lola majeure
Dors, ma peine, ma douleur
Tu as perdu de ta couleur
La seule qui porte bonheur
C'est Lola majeure
Dès lors, légère, je m'envole
Mon âme ne touche plus le sol
Et plane en apesanteur
Sur Lola majeure
Oh dors, mon ange, ma douceur
En toi, ce qu'il y a de meilleur
En nous, fait battre mon coeur
En Lola majeure
Tu fais battre mon coeur
En Lola majeure
O renascimento de Vénus
I
Noctívaga é a ternura
que deambula pelos teus dedos
enquanto divago pelas montanhas à procura do sílex
mais puro
afinal o sagrado lume que se acendia em mim
eras tu que tocavas as estrelas
eras tu o meu cume
na tua humanidade inacessível
II
depois adormecemos no tapete
onde persiste um gato persa
a entretecer com suas garras os farrapos de luz
entre reflexos de loiça chinesa
às escondidas do tempo que se esfuma
desfiando derradeiros fragmentos
de solidão e de tristeza
não sei onde te escondes
ou onde acaba a bruma
III
a minha língua desce
como um raio afiado de sol
até à gravidade do umbigo
olho da tempestade
antes do agridoce perfume da erva
nesta incessante demanda
que nos permitiu libertar-nos
de uma falsa divindade
e do precipício da soberba
IV
persegue-me o paciente lince
que acabará por te assassinar
mártir por puro engano
num instante meu de distracção
nunca me perdoarei
que o mesmo tenha franqueado
por essa brecha,
o meu menosprezo pelo perigo
e esta atracção que me alucina
do sacrifício de uma beleza felina
à arte pela arte
V
prometi-te que estaria atento
nesse obscuro postigo
onde me contaste todos os segredos
e todos os medos
onde sussurravam as medievais sentinelas
e se ouvia o submerso discurso
nas masmorras da razão
oblíqua e sombria
coada nos vitrais do desencanto
e nesse filtro exangue do teu coração
agora prostro-me em oração
a resistir aos sentimentos
VI
Resta-me agora reconstituir o puzzle primordial
pois
dizem
ninguém pode sobreviver sem um rumo
e isso é plausível
discute-se se será necessário
ter tanto de inquieto como destemido
de médico e de louco
tudo isso me é indiferente
depois de descobrir
que estás espalhada por toda a parte
VII
lembro-me de avistar um vasto território
alcandorado
lembro-me da saliência dos teus seios
nos meus lábios
que aprendiam a trautear
um cântico inédito
lembro-me
da piedosa extinção do fogo
nos teus olhos
perante a branca sofreguidão
do leite derramado
VIII
enquanto isso
os sonhos vão ficando etéreos
e definhando
por fim
falecem
e são embrulhados em lençóis
à espera de serem reconhecidos
estamos todos demasiado ocupados
para sermos reconhecidos
nesta vala comum
e tu estás viva em toda a parte
para resolvermos tão complexas equações
apodrecemos no nosso ingénuo contentamento
e fazemos rascunhos
encenados de sol e de mar encurralado
literalmente de bronze
amestrados
tu meu amor fugiste para a tua zona de conforto
eu refugiei-me na tua religião
IX
devia perder-te
contudo
os mal entendidos
bem cedo foram desfeitos
ficou definida a tua recusa
para que pudesse amanhecer o sorriso
e a sombra dos pássaros
no teu rosto
e eu fosse pecado
e tu não deixasses de ser deusa
X
Vou pela floresta de murmúrios
tenho esta imensa afinidade
na frequência do tédio e da imundície
das moscas e de outros insectos
que pressentem qualquer incumprimento
e sublinham os sucessivos deslizes
de palavras impróprias
e reiteram denúncias caluniosas
e dominam o dicionário
dos pequeno toques de pés de barro
de deuses de mãos intrépidas
neste lupanar de subtilezas
que faz de trivialidades
as grandes aventuras
dos pusilânimes
XI
Afago-te
somente ao de leve
mas o suficiente para apagar
a chuva que no teu rosto pálido te beijava
estás tranquila
corajosa
embora soubesses de véspera
que amanhã
ia começar o mundo
onde eu não podia existir
para que fosses
sempre ditosa
XII
ao leres os sinais e esboços
no céu pardacento
fico em destroços
por não perceber
o nosso ocaso
nas entrelinhas da tua língua estrangeira
do céu e dos astros
é grande a tua competência de medir a pulsação
do meu pequeno mundo
XIII
se te despires
não tenho dúvidas que nascerá um novo tempo
e hei-de de novo perdoar-te
perante essa tua
última celebração nua
hei-de desfazer-te da apreensão das tuas últimas rugas
lamber de novo as minhas feridas
e a partir da memória das tuas lágrimas já secas
vou serenar
as arestas das tuas mãos
e reencontrar a sua gratidão
as dionisíacas festas
a cor celestial
e abraçado ao teu busto
te confundas no desabrochar das flores
e sejas a nova alvorada da cidade
em abundância e fertilidade
e te abandones
possuída de um amor mortal
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2012
Carlos Vieira
“O Nascimento de Venus” - Botticelli
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