quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Teu corpo meu barco imaterial



Quem sou eu?
Em que momento da tua luminosidade
me perdi?
Qual o teu lado mais negro?
Este frio que me transe
serão apenas teus olhos
que abandonam
uma parte de mim?

A tristeza que irradias
será a quietude onde te aguardo?
Tu me desconheces
e, no entanto, a tua dor  
se adequa à minha ausência.

Atingimos os mais altos cumes
e temperaturas
que proporcionam a duração das distâncias
que acolhem a memória das partículas
do teu corpo
que se pode decompor em música.

E, se a velocidade da tua sombra se apodera
dos meus dedos desertos
como posso sobreviver
neste dilúvio da chuva e de cinza
que cai
ou a este momento de trevas?

Sobre a carne cálida e sequiosa
nos teus lábios entreabertos
deflagram improváveis realejos
murmurando inéditas partituras,
reencontramo-nos a caminho
do mar amniótico interior e ancestral
no deslumbramento do teu corpo
aceso na curva das ondas
onde podemos de novo escutar
um sussurro, uma azáfama de beijos
no regresso ao eco líquido e seminal.

Karlsruhe, 9 de Outubro de 2012
Carlos Vieira

                                León Ferrari  “Declaraciones de Scilingo, Nunca Más” 1995


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