sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Ave haiku LVI




O papagaio verde à varanda,
no poleiro, vendo a vida lá fora 
ficou de bico aberto, perdeu a fala.

Lisboa, 27 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Ave haiku LV



Deixava-me levar pela mão do tratador,
nesse tempo a poesia era as aves conhecerem meu nome 
e a impressão da cor, da textura e do odor das sementes.

Lisboa, 27 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Ave haiku LIV



Na câmara escura do imaginário sobrevive
um pato real que regressa da eternidade 
rompe o nevoeiro e sobrevoa o sapal.

Lisboa, 27 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Ave haiku LIII



Lembro-me como se fosse hoje, tinha cinco anos, 
a espreitar pelo buraco da fechadura do portão do zoo
a imagem da primeira avestruz curiosa e altiva.

Lisboa, 27 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Errância

 

Poema a poema
vai tentando encontrar o seu caminho.
Corre atrás das palavras
e desconfia das que lhe vêem comer à mão,
não quer crer que este não é o caminho.

Lisboa, 27 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Da precipitação do amor


O itinerário serpenteante
de permeio a doçura das bétulas
emoldura teu rosto molhado
fixas a tristeza ferrugenta do arado
impávido perante a nossa pressa 
e a incerteza das colheitas
adivinham-se a urgência dos gestos 
insinuava-se no horizonte rural
o fulgor dos teu peito intransigente
o fumo das chaminés desvanece
no esplendor dos teus ombros
despeste-te tão lentamente 
num tempo em que só acontece 
a palavra espontânea de desejo 
amordaçada e o olhar helicoidal
por cima do cinismo dos homens
e a inveja dos deuses desafiando
amavamo-nos ao ritmo da chuva 
inclemente e torrencial.

Lisboa, 26 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira


What The Rain Brought by Mag3llan



Ave haiku LII

 

O milhafre paira em círculos
o pequeno roedor arrisca a fuga
em linha reta.

Lisboa, 26 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira